Todos os dias eu olho as lições do Loretto. Bom, na verdade, nem todos os dias ele faz lição. Às vezes, eu pergunto: “Loretto, o que você fez hoje?”. E ele responde: “Eu fiquei cavando o parque” (ele tem certeza absoluta de que há tesouros escondidos no terreno da escola) ou “Eu desenhei…” ou “Eu fiquei nas árvores”. Enfim, já entendi que ele não tem o perfil CDF da mãe e estou digerindo isso. Outro dia, passei para ele um problema de matemática. Desses em que alguém ganha alguma coisa, depois perde outra e a criança tem que descobrir com quantas coisas o infeliz personagem ficou no final. Ele se embananou todo. Após dez minutos, eu perguntei: “Mas a que solução você quer chegar?”. E ele me olhou e respondeu: “Eu não quero chegar a solução nenhuma…quem quer é você!”. Tóim!
Crianças são práticas. Mas o melhor exemplo de praticidade, vi na lição de ontem. Um lindo conto indiano, com uma princesa (a Fátima!) que, durante uma terrível chuva, sofria um naufrágio. Resgatada por um costureiro, aprendera a tecer. Depois, na tentativa de voltar ao seu reino, pegava um novo navio. Nuvens negras se aproximaram, chuva torrencial caiu do céu, e ela naufragou novamente. Dessa vez, foi resgatada por piratas. E vendida a um rei. Um rei que precisava de alguém que tecesse uma tenda. Ela, que havia aprendido a tecer, fez a tenda, agradou o rei, casou-se com ele e viveu feliz para sempre (com seu status de família real resgatado!). O capítulo inteiro (do livro de português, da Coleção Buriti, ed. Moderna) era construído no sentido de mostrar para as crianças que, por mais desventuras que alguém encare na sua vida, sempre há o que aprender e todo aprendizado é útil. Loretto, leu, desenhou, procurou palavras no dicionário, enfim, fez tudo que o livro pedia. No final, a pergunta: “Que exemplo esse conto pode dar para o leitor?”. A resposta do Loretto foi surpreendente, foi mágica, foi tudo que eu precisava ler naquele momento, foi um exemplo claro da sensibilidade do cromossomo Y herdado do Maurício:
“NUNCA NAVEGUE NA CHUVA!”
É isso! A gente vive investigando problemas de matemática, cheios de ganhos e perdas, e a criança fala: isso é tudo invenção sua… A gente vive caçando lições de moral, um sentido maior para o mundo, para a vida. E a criança fala: o único sentido é viver. Não se esqueça: o único sentido é viver!